Diário
do Congresso Nacional
Sessão |
Publicação |
Assunto |
Página |
Coluna |
10/07/62 |
11/07/62 |
Parecer
do Desembargador Souza Neto, do Tribunal
de Justiça do D.F. a respeito da
realização do plebiscito sobre
manutenção ou não do
Ato Adicional nº 4 (Parlamentarismo) |
4176 |
3ª |
O
SR. PRESIDENTE:
Tem
a palavra o Sr. Mário Palmério.
O
SR. MÁRIO PALMÉRIO:
(Para
explicação pessoal. Sem revisão
do orador) Sr. Presidente e Srs.
Deputados, as estações de rádio
e os jornais matutinos de maior expressão
publicam, hoje, parecer do eminente Desembargador
Souza Neto, do Tribunal de Justiça do
Distrito Federal, sôbre a momentosa questão
da realização do plebiscito. Documento
dos mais importantes e que traz subsídio
valioso à questão, desejo que
fique nos Anais êsse pronunciamento do
eminente Desembargador. Visando êsse fim,
passo a lê-lo na íntegra, conforme
foi publicado pelo "Diário de Notícias"
de hoje, 10 de julho:
"Em
parecer sôbre o Parlamentarismo e a realização
do plebiscito para sua aprovação
o desembargador Sousa Neto diz que "não
se executa o que não existe" acrescentando
que "o artigo 25 do Ato Adicional não
pode ser interpretado por quem não esteja
familiarizado com a hermenêutica constitucional"
pois "improvisou-se a anárquica
emenda parlamentarista, concebida e aprovada
em poucas horas noturnas, em tão grave
atropêlo constituinte que hoje só
não estão arrependidos do mal
que causaram à Nação alguns
dos que, por meio dela, se apossaram de poderes
esbulhados ao presidente da República".
Assevera
o Sr. Sousa Neto que, não havendo lei
sôbre o plebiscito, caberá à
Justiça disciplinar a matéria.
O Ato Adicional diz atribuiu ao
Congresso a faculdade de disciplinar a consulta
popular, ao usar a expressão "poderá
dispor" sôbre a realização,
quando o sentido claro do texto é o "O
Parlamento também tem competência
para tratar do assunto", embora não
seja competência exclusiva.
ABSURDO
Prosseguindo,
lembra que "a interpretação
de que o Congresso é o único poder
competente para regulamentar o plebiscito levaria
a insanável absurdo. Se a competência
fôsse exclusivamente sua e se o Ato Adicional
declara que é livre para legislar em
tôrno do assunto (porque quem pode dispor
não obrigado a dispor) bastaria que resolvesse,
por interesse ou por paixão política,
não disciplinar o plebiscito, para não
haver plebiscito. Êsse entendimento é,
portanto, condenável sob todos os pontos
de vista.
E
que fêz o Congresso, a êsse respeito?
Elaborou a Lei Complementar, cuja redação
final já foi aprovada, sem nela inserir
uma palavra acêrca do plebiscito. Não
quis, todavia, usar da faculdade constitucional
de editar preceitos para a sua realização.
Como não está obrigado a fazê-lo,
deixou o assunto entregue em tôda a sua
amplitude, à Justiça Sleitoral
(sic), que com êle concorre, por fôrça
da Constituição, na execução
dos atos destinados à colheita de sufrágios
políticos. A lei que elaborou segundo
a autorização do artigo 22, na
qual silenciou, conscientemente, em tôrno
do plebiscito, é completa e definitiva,
completamentando (sic), miùdamente, o
novo sistema de govêrno, como se vê
da clareza e da extensão máxima
de sua emenda:
"Complementa"
a organização do sistema parlamentar
de govêrno, e estabelece outras disposições".
CAUSA
PRÓPRIA
Continua
o desembargador: "Sabendo que podia deixar
de dispor sôbre o tema, o Congresso tudo
enquadrou na complementação, além
de estabelecer outars (sic) disposições,
renunciando à sua parte de competência,
às vésperas das eleições
parlamentares, que não se podem realizar
antes da escolha do regime político.
O
que se veda à Justiça Eleitoral
é a criação do plebiscito,
pois sòmente o poder constituinte que
promulga e reforma cartas políticas,
pode institui-lo. No presente caso, substituindo-se
a forma da República Presidencialista
pela Parlamentarista, com despojamento de poderes
do presidente da República, para acrescê-lo
aos da Câmara dos Deputados, era evidente
uqe (sic) os parlamentares, sem a prévia
anuência da Nação, estavam
obrigados a solicitar posterior e imediata aprovação.
Se agiram em crise abrupta e irresistível,
de natureza militar tinham o dever, uma vez
libertos da pressão dos fatos; de devolver
o país à constitucionalidade,
para não sofrerem a acusação
de substituirem, em causa própria, o
golpe militar pelo golpe civil. Debelada a turbação
política, permanecer no gôzo das
competências anormais, geradas, como se
afirma, pela ameaça de cataclismo militar,
é tomar o lugar dêste ou aproveitar-se,
indevidamente, de seus efeitos, regalando-se
com vantagens inconstitucionais, obtidos e mantidas
à revelia do titular da soberania política:
o povo.
Invalindo-se
a área íntima e conteudística
do artigo 25, colhe-se uma das verdadeiras intenções
dos autores da emenda parlamentar. Afirma-se,
ali, que o plebiscito decidirá da "manutenção
do sistema Parlamentar ou volta ao sistema Presidencial".
EXPERIMENTAÇÃO
A
intenção constituinte era de que,
antes da realização da consulta
plenária popular, se experimentasse o
iovo (sic) regime. O plebiscito decidiria da
"manutenção" do Parlamentarismo
ou volta ao Presidencialismo. Há portanto,
uma condição fundamental para
a execução do plebiscito: a vigência
do regime adotado. Se fôsse causa de perturbações,
de angústias administrativas e de convulsões
sociais, a Nação retornaria ao
sistema Presidencial, devolvendo-se ao presidente
da República os poderes arrebatados a
2 de setembro. A realização do
plebiscito não a sua instituição
só dependia da experimentação
do novo tipo de govêrno. Preenchida que
foi essa condição básica,
num clima de crises e abalos gravíssimos,
na mais deplorável das vivências
políticas tudo provocado pelo ominoso
sistema político, impõem-se a
aplicação imediata do mencionado
artigo 25, submetendo-se o Ato Adicional ao
juízo popular.
RECONQUISTA
Pôr
fim, o Sr. Sousa Neto acentua: "Mostramos
que o plebiscito esperaria por um processo de
experimentação do Parlamentarismo.
Essa quadra experimental, que vem sendo de suma
trigicidade, demonstrativa de que o Presidencialismo
desenfreia menos o impatriotismo das cúpulas
e o egoísmo das procuraturas, corresponderia
pròximamente ao tempo da vigência
dos mandatos federais do período Presidencial
a que alude o artigo 25. Prescreve o artigo
24 que ficam respeitadas até o seu término,
os mandatos federais, estaduais e municipais.
Êsse respeito, que não se votou
ao mandato do presidente, que sofreu os efeitos
da mais violenta inconstitucionalidade com a
transferência de pôderes especiais
para os deputados, irá até 31
de janeiro de 1963, data de posse do novo Parlamento.
A fase de prova do Parlamentarismo alcançaria
as fronteiras dessa data, para evitar que a
volta ao sistema Presidencial, antes da terminação
dos mandatos federais, impusesse a reconquista
dos podêres ao presidente da República
assaltados, em seu proveito, pelos parlamentares.
Esta foi também uma das razões
talvez a principal por que não
se quis o plebiscito imediato adiando-se sua
execução par (sic) data que ensejasse
o seu gôjo pleno e total. Esta demonstração
ajuda a convencer que a época da consulta
plebiscitária deve anteceder a renovação
do Parlamento, através da eleição
de outubro. Experimentado o regime, salvos e
mantidos os mandatos federais, não há
como esperar-se por nova provação
bíblica do povo brasileiro, nem por mais
um quatriênio de um Parlamento que, aos
seus Podêres Legislativos e Comuns, soma
funções executivas e que pretende
furtar-se ao teste plebiscitário, porfiando
em desfrutar, sem prévio julgamento nacional,
mais uma quadra de poder ilegítimo, menos
temente de Deus do que da justiça popular".
Sr.
Presidente, votei contra o parlamentarismo,
contra a emenda, contra o Ato Adicional, naquelas
trágicas sessões de agôsto,
apesar de ter sempre votado com o eminente Deputado
Raul Pilla quando da tramitação,
em época normal, de sua emenda instituindo
êsse regime no Brasil.
Estou
muito à vontade, portanto, para falar,
e sinto-me feliz em verificar que, como eu,
pensam também aquêles que consideraram
e que consideram a transformação
do regime, em época de crise, sob pressão
militar o mais clamoroso esbulho que se fêz
ao atual Presidente da República e sobretudo
ao povo brasileiro.
Desejo
ressaltar também aqui um fato que reputo
da maior gravidade e que vem revelar a má
fé em todo êsse assunto de parlamentarismo
ou presidencialismo que tem sido votado na Casa.
Quando
se discutia a lei complementar, isto é,
a lei que viria completar o Ato Adicional, a
sua lei reguladora, houve uma emenda, pelo menos
uma, e dessa tenho notícia, de autoria
do nobre Deputado Humberto Lucena, presente
no plenário, que mandava fixar a data
do plebiscito; e as lideranças e o Congresso
dela não tomaram conhecimento, nem da
necessidade de ser fixada a data do plebiscito
para que o povo pudesse, consultado por essa
forma, dar sua opinião soberana sôbre
o regime.
Verifica-se,
portanto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que
tudo sôbre êsse assunto tem sido
feito nesta Casa com má fé. E
hoje, que a matéria vem à baila,
comprovamos isso. O povo já sente que
não terá o seu plebiscito, e a
Justiça Eleitoral se sente no dever de
agir, provocada por uma reunião da maioria,
quase totalidade, dos governos do País.
Sr.
Presidente, registro neste meu modesto discurso,
com o maior prazer, a fim que figure nos Anais
desta Casa, como meu ponto de vista, o parecer
do eminente Desembargador Joaquim Souza Neto,
comprovando, assim, que o assunto já
está fugindo da nossa alçada,
fugindo da alçada apenas do povo para
transformar-se, dentro de pouco tempo, numa
das maiores batalhas judiciárias de tôda
a História do País.
O
SR. PRESIDENTE (Wilson Calmon) / Comunico ao
eminente orador que o tempo destinado a esta
sessão está terminado, assim como
a respectiva prorrogação. Solicito
aos deputados aparteantes que sejam breves.
O
Sr. Ultimo de Carvalho Depois
que percorremos nossos colégios eleitorais,
voltamos a esta Casa convencidos de que o povo
deseja mesmo o plebiscito, a fim de opinar entre
o parlamentarismo e o presidencialismo. Tenho
a impressão que nesta Casa todos estão
acordes quanto ao plebiscito.
O
SR. MÁRIO PALMÉRIO Quero
lembrar a V. Exª, apenas para auxiliar
seu raciocínio, que todos estão
acordes, mas na lei que completa e regulamenta
o Ato Adicional não há uma palavra
sôbre o plebiscito, onde a matéria
é de direito.
O
Sr. Ultimo de Carvalho Todos nesta
Casa estão acordes. Nós só
discordamos quanto à data. Não
desejamos é que o plebiscito se realize
no dia 7 de outubro, como pretendem certos interessados
em se elegerem nas costas dos plebiscitários.
O
SR. MÁRIO PALMÉRIO È
um recurso normal e legítimo.
O
Sr. Ultimo de Carvalho É
um recurso imoral; não é legítimo.
V. Exª perdôe-me. Faço justiça
à sua inteligência e cultura, mas
não concordo com essa tese. O povo é
convocado para opinar em estado de espírito
de tranqüilidade sôbre o sistema
político da Nação brasileira.
Êle deve ser recrutado para isso. Mas
com que serenidade poderá o povo pronunciar-se
numa eleição que se ferirá
no Rio Grande do Sul para governador de Estado,
para deputado federal, estadual, prefeito municipal,
vereador e juiz de paz? Mistura-se tudo com
o plebiscito. Não. Estou pronto a assinar
qualquer medida para que se proporcione ao povo
brasileiro, plebiscito, contanto que seja antes
do dia 7 ou depois do dia 7. No dia 7 de outubro,
não, porque não vamos agora fazer
eleição para que vigaristas sejam
eleitos. Não. Se alguém quer levar
vantagem sôbre a eleição
dos Srs. Deputados, que se candidate, mas fora
do plebiscito. Plebiscito é uma questão
diferente. Vamos escolher um dia antes de 7
ou depois de 7 para o plebiscito.
O
Sr. Humberto Lucena Aparteio V.
Exª apenas porque, de certa maneira, fui
chamado à colação. A palavra
de V. Exª restabelece a verdade dos fatos.
Na ocasião da Lei Complementar, apresentei
a emenda a que V. Exª se referiu, marcando
a data do plebiscito, dentro do prazo do Ato
Adicional, para 9 de abril de1963. E houve um
detalhe, nobre Deputado Mário Palmério:
o Presidente João Goulart, num gesto
aliás de grande nobreza, pois êsse
plebiscito não aproveitaria a S. Exª,
uma vez que seria no fim do seu mandato, mandou-me
dizer que estava de pleno acôrdo com a
emenda. Infelizmente, não houve compreensão,
e a matéria, considerada controvertida,
foi adiada. E estamos nós agora diante
dêsse impasse, do qual não sairemos
com a apresentação de uma emenda
constitucional.
O
SR. MÁRIO PALMÉRIO Sr.
Presidente, Srs. Deputados, concluindo, desejo
afirmar que se cometemos um esbulho votando
sob pressão militar em época de
crise, ferindo a própria Constituição,
que não aconselha reformas constitucionais
em época como esta, não podemos
cometer um novo e mais grave esbulho, qual seja
o de permitir que o novo Congresso que se instalará
a 31 de janeiro de 1963 seja composto de representantes
que não se tenham definido perante o
eleitorado sôbre suas convicções
a favor do presidencialismo ou a favor do parlamentarismo.
Se tal acontecer sem autorização
popular, sem obrigação, sem compromisso
com o povo para votar nesta Casa qualquer emenda
constitucional neste sentido. (Muito bem;
muito bem)
DIÁRIO
do Congresso Nacional.
Sessão: 10/07/62. Publicação:
11/07/62. Assunto Parecer do Desembargador Souza
Neto, do Tribunal de Justiça do D.F.
a respeito da realização do plebiscito
sobre manutenção ou não
do Ato Adicional nº 4 (Parlamentarismo).
p. 4176. Coluna: 3.
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