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25/4/52 26/4/52 Narrativa dos acontecimentos do Triangulo Mineiro 3244

 

O SR. PRESIDENTE — Há sôbre a Mêsa e é deferido o seguinte:

REQUERIMENTO

Câmara dos Deputados.

Senhor Presidente:

Peço que seja concedida a palavra, para uma comunicação urgente, em nome da Bancada Trabalhista, ao Deputado Mário Palmério.

Sala das Sessões, em 24 de abril de 1952.

Deputado Brochado da Rocha, Líder da Bancada do PTB.

O SR. PRESIDENTE — Tem a palavra o Sr. Mário Palmério.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Sr. Presidente, senhores Deputados, pretendia ocupar ontem esta tribuna para relatar os graves acontecimentos que se desenrolaram nas cidades de Uberlândia e de Uberaba, não o tendo feito em virtude da realização da sessão do Congresso Nacional.

Venho, hoje, porém, denunciar a esta Casa o procedimento violento e injusto que o Govêrno do Estado de Minas vem dispensando às populações das grandes cidades localizadas na região conhecida como "Triângulo Mineiro". Essa atitude da administração do estado montanhês é a única responsável pelas gravíssimas ocorrências verificadas naquelas duas cidades. A imprensa tôda noticiou com grande destaque tais acontecimentos, impressionando profundamente àqueles qu (sic) etomaram (sic) conhecimento dêsses fatos.

Procurei entender-me pelo telefone interrubano (sic) com pessoas ali residentes e, realmente, por essas (sic) telefonemas e por inúmeros telegramas que venho recebendo, a situação se revestiu de suma gravidade. Tive a preocupação de verificar se o movimento tinha inspiradores ocultos, interessados na desordem. Posso assegurar à Casa, porém, que o movimento foi geral e contou com a solidariedade de tod (sic) oo (sic) povo, só degenerando em conflito devido à reação violenta de funcionários estaduais. O que houve foi o estouro, a exteriorização do descontentamento popular, há muito pacientemente suportado... Tantas humilhações vêm recebendo, tanta injustiça e exploração vêm sofrendo, que explodiu finalmente!

O povo de Uberaba, cansado da exploração fiscal que vem o Govêrno praticando, acabou depredando as coletorias estaduais, a Superintendência dos serviços fiscais, e outras repartições públicas, em sinal de protesto contra os abusos do govêrno estadual, motivando a ida para aquelas cidades tanto de Uberaba como a de Uberlândia, d (sic) egrande (sic) fôrça policial, do Estado de Minas Gerais armada de metralhadoras, bombas de gás, etc. etc.

Tudo isso poderia perfeitamente ter sido evitado. Telegramas ao Govêrno, apêlos de tôdas as entidades de classe e associações, as manifestações da imprensa da região, reuniões, "mesas redondas", tudo, tudo foi tentado...

O silêncio do Govêrno e o recrudescimento da vigilância policial insistindo na manutenção dos postos fiscais e nos processos violentos e ilegais na taxação e na cobrança dos impostos foi a única resposta... Verdadeira sanha arrecadadora empolga, hoje, o Govêrno estadual de Minas Gerais! Quer tirar, a todo o custo, os últimos tostões do povo! E os fazendeiros e os motoristas são os mais visados...

A greve pacífica foi o último remédio tentado.

Desejo, Sr. Presidente, ler para conhecimento da Casa um telegrama passado por S. Ex.ª o Professor Paulo Lisboa, presidente da Câmara Municipal de Uberlândia, cidade onde se iniciou um pacífico e unânime movimento de protesto, ao Sr. Ministro da Justiça, telegrama que demonstra como receberam as autoridades estaduais a tentativa pacífica de solucionar a crise:

"Levamos ao conhecimento de V. Ex.ª que as autoridades policiais, dirigidas pelo Chefe de Polícia interino do Estado, tentaram impedir a realização de uma sessão da Câmara, convocada extraordinàriamente a fim de resolver o problema da greve do povo de Uberlândia. Ao levar a V. Ex.ª, em nom (sic) edo (sic) povo uberlandense, o nosso mais veemente protesto contra a absurda medida policial, que é a verdadeira negação do regime democrático, solicitamos abertura de rigoroso inquérito, a fim de apurar quais são os responsáveis por tais atentados. Respeitosamente: (a) Paulo Lisboa da Costa, Presidente da Câmara Municipal de Uberlândia".

OOutra (sic) mensagem telegráfica a mim dirigida, pelo mesmo ilustre presidente da Câmara Municipal de Uberlândia, homem culto, professor universitário, conhecido e respeitado pela prudência de que se revestem seus atos públicos, esclarece melhor o terror policial, a violência indefinivel praticada pelas autoridades policiais comandadas pelo próprio Chefe de Polícia do Estado, e prestigiadas pela presença do Sr. Secretário das Finanças!

Deputado Mário Palmério

Câmara dos Deputados — Rio — DF.

"Como presidente Câmara Municipal Uberlândia venho comunicar V. Ex.ª que procurando colaborar autoridades estaduais sentido solucionar greve pacífica motoristas desta região avaliados hoje em mil veículos parados, Câmara Municipal ontem realizada depois tôda sorte arbitrariedades autoridades policiais inclusive Chefe Policia aqui presente pt. Queremos protestar enérgica e veementemente contra atos arbitrários Chefe Polícia determinando proibição entrada vereadores Câmara Municipal sob fútil pretexto guarda estação rádiotelegráfica funciona mesmo prédio pt. Quando permitiu entrada vereadores passamos entre baionetas caladas como se fôssem criminosos e não representantes do povo altivo uberlândia Sds. Paulo Lisbôa e Costa Presidente da Câmara Municipal".

O Sr. Rondon Pacheco — Permite V. Ex.ª um aparte?

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Pois não.

O Sr. Rondon Pacheco — Idêntica mensagem recebi do presidente da Cmara (sic) Municipal de Uberlândia. Atos dessa natureza são realmente de se lamentar, porquanto a cidade de Uberlândia não pode sofrer tais atentados. Deixo aqui o meu veemente protesto, como representante daquela região.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Sr. Presidente, o povo ordeiro, a população de Uberlândia declararam-se em greve pacífica e, logo em seguida, o povo de Uberaba, contra as arbitrariedades fiscais e policiais do Estado. Desejo, agora, relatar a V. Ex.ª e à Casa o que vem acontecendo naquela região.

O Sr. Secretário das Finanças de Minas Gerais mandou instalar, nas entradas e saídas daquelas cidades, postos fiscais, com a incumbência de taxar mercadorias, examinando, rigorosamente, todo e qualquer veículo que por ali transite. Fazendeiros residentes no Município não podem mais levar um saco de sal ou de cimento para sua fazenda, nenhum material de que obrigatòriamente necessite, para serviços em sua propriedade, a não ser acompanhado de guia extraída na Superintendência. E não podem mais transportar um frango, uma galinha, uma dúzia de ovos, enfim, qualquer mercadoria de produção de suas fazendas, sem que os fiscais estaduais a taxe, e a taxação é feita "manu militari", com a presença de policiais embalados, da Fôrça Pública!

O Sr. Bilac Pinto — Tanto mais grave é o fato ora denunciado por V. Ex.ª quanto, no Estado de Minas, a Lei 828, alterando a Lei 760, privou êsses postos fiscais da competência de receber impostos.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Exatamente.

O Sr. Bilac Pinto — Não obstante esta circunstância e contra a disposição expressa do art. 27 da Constituição, o govêrno mineiro, além de ter elevado exageradamente os impostos, no Estado, ainda os arrecada de forma ilegal e inconstitucional.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Muito obrigado a V. Ex.ª pelo aparte.

O Sr. Vasconcelos Costa — Permita-me um aparte. Aliás, temos verificado pela imprensa a tendência do atual govêrno de Minas para inculcar aos comunistas a responsabilidade dessas greves. Entretanto, nada têm de comunismo...

O SR. MÁRI (sic) PALMÉRIO — Estou d (sic) eacôrdo (sic) com V. Ex.ª nêsse ponto.

O Sr. Vasconcelos Costa - ... é o princípio de uma reação do tipo revolução francesa que se está processando no Triângulo Mineiro em virtude do sofrimento do povo contra o prazer dos palacianos.

O SR. PRESIDENTE — Atenção! O tempo de V. Ex.ª está a findar.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Sr. Presidente, o fato é grave e pediria a V. Ex.ª conceder-me mais alguns minutos. O govêrno acusou os comunistas de Uberaba e de Uberlândia de serem os inspiradores dêsse movimento. Uberaba é uma cidade que conta com quinze vereadores municipais, não havendo entre êles um único comunista. Não existe comunismo no Triângulo Mineiro, como pretende o govêrno de Minas, alardear. O que aconteceu foi a explosão incontida da revolta popular contra o absurdo da cobrança de impostos feita por fiscais e policiais em minha região.

O Sr. José Bonifácio — V. Ex.ª podia contar o episódio, ocorrido em uma cidade de Minas, das duas rodas de carro de boi. Um fazendeiro mandou duas rodas para consertar. Ao passar na barreira fiscal pagou impôsto. Quando as rodas vieram de volta, consertadas, o fazendeiro pagou novo impôsto, e maior, porque as rodas estavam novas...

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Sr. Presidente, o fato mais grave, porém, não é êsse. Declaro desta tribuna, e o faço solenemente, que há verdadeira intenção de tentar desmoralizar o govêrno de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República. Os fiscais do Estado declaram abertamente a todos aquêles que são taxados: "Votaram em Getúlio, agora paguem o impôsto" tentando lançar o povo contra o govêrno federal que nada tem com isso, porque os impostos cobrados são, todos êstes, estaduais como, também, a polícia que em tudo está presente! Cobram impostos os mais absurdos, os mais escorchantes, de todo ilegais, não devolvem um ceitil, um real de benefícios para aquela região, e jogam a culpa no Govêrno Federal.

No Triângulo, onde estão as grandes vias rodoviárias de penetração, tanto para Goiás, como para Mato Grosso, uma média de 800 a 900 caminhões passam diariamente naquelas estradas. O Govêrno não conserva essas estradas propositadamente. Provoca o descontentamento ostensivamente e procura, subterráneamente, culpar o Govêrno Federal. Além disso, coloca porteiras, fiscais, policiais, impedindo o tráfego normal dos produtos agrícolas locais.

O Sr. Vasconcelos Costa — Humilhando, assim, o povo, pois impôsto não se cobra com porteiras.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Infelizmente, não posso alongar minhas considerações.

Declaro, desta tribuna, que estou, como representante do povo do Triângulo — como os outros três representantes do povo do Triângulo nesta casa Srs. Vasconcelos Costa, Rondon Pacheco e Leopoldo Maciel — inteiramente solidário com o povo de minha terra revoltado com o procedimento injusto, com o procedimento nefasto do Govêrno do Estado contra o povo daquela região. Assim o digo, porque sei que êste é o meu dever, o dever de estar com o meu povo nas suas horas cruciais e não apenas quando vou lhe pedir os seus votos.

Todos os representantes daquela região estão com o povo do Triângulo contra as violências e arbitrariedades do atual Govêrno do Estado... Isso é a maior prova de que estamos certos, o povo e os seus representantes, e não o governo.

O Sr. Monteiro de Castro — Queria manifestar, também, a solidariedade dos povos das demais regiões do Estado ao do Triângulo, pois também nos sentimos premidos pelo regime fiscal do Govêrno de Minas Gerais. Essa afirmativa do Executivo mineiro de que o movimento teria sido inspirado por comunistas é uma balela, que os fatos desmentem, porquanto foi gerado e inspirado pela insatisfação do povo, em face do escorchante tributo cobrado pelo Govêrno de meu Estado.

O Sr. Vasconcelos Costa — O atual Govêrno de Minas está pondo a prêmio uma das Secretarias, atualmente vaga, a do Interior. Assim, julga que o povo do Triângulo, tendo um seu representante nessa Secretaria de Estado, concorde em aderir ao bloco do Govêrno. Engana-se o Govêrno, porque o que o povo do Triângulo quer é justiça, estradas, bom tratamento e, sobretudo, dignidade.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Sr. Presidente, agradeço a tolerância que teve para comigo.

Deixo a tribuna reiterando o nosso protesto contra a violência do atual Govêrno do Estado e o responsabilizando pela intranquilidade e violências que têm lugar, hoje, nas cidades do Triângulo. O povo quer trabalhar, quer produzir, quer progredir, quer justiça paar [sic] poder gozar de tranquilidade... Não foge ao pagamento de impostos justos e razoáveis. Sempre os pagou. O que não quer é porteiras e soldados entravando o seu trabalho, tomando o seu tempo e praticando violências. Não quer continuar a ser injusta e torpemente humilhado. Não quer é ver seu dinheiro arrancado e levado para longe4 (sic) Devolvam-nos o nosso dinheiro com benefícios... Construam estradas para o escoamento da nossa gigantesca produção agropecuária... Dêm-nos luz, água, esgotos, escolas, hospitais para as nossas cidades e todos pagaremos os impostos co (sic) mprazer (sic). Saibam, porém, cobra-los com dignidade, porque o nosso povo não suporta mais humilhações. (Muito bem; muito bem).


DIÁRIO do Congresso Nacional. Sessão: 25/4/52. Publicação: 26/4/52. Assunto: Narrativa dos acontecimentos do Triangulo Mineiro. p. 3244. Coluna: 1.