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24/1/52 25/1/52 Lendo oficio Sociedade Rural do Triangulo Mineiro denunciando grupo com o privilégio de importar gado indiano. 405

 

REQUERIMENTO

Sr. Presidente:

Como líder do Partido, solicito a V.Ex.a conceder a palavra ao Sr. Deputado Mário Palmer (sic) durante dez minutos, para uma comunicação.

Sala das sessões, 24 de janeiro de 1952. — Joel Presídio

O SR. PRESIDENTE — Tem a palavra o Sr. Mário Palmério.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO (Para uma comunicação) — Sr. Presidente, e Srs. Deputados, encontrava-me anteontem na cidade de Uberaba quando fui procurado pelo Presidente da Sociedade Rural do Triângulo Mineiro e por numerosos outros diretores dessa entidade de real prestígio na classe dos pecuaristas do Brasil Central, e quiçá de todo o país, que denunciaram a existência de um grupo de negociantes de gado e de outras pessoas estranhas à pecuária interessados na importação de reprodutores zebú (sic) diretamente da Índia.

Trouxe-me, nessa ocasião, o Presidente da Sociedade Rural do Triângulo Mineiro, Sr. Dr. Carlos Smith o ofício que tenho em mãos e que passo a lêr:

Uberaba, 22 de janeiro de 1952

Ilmo. Sr. Deputado Mário Palmério — Uberaba.

Saudações:

Tendo chegado ao conhecimento da S.R.T.M., informação de que autorização tenha sido dada à firmas importadoras para trazer gado zebú (sic) da Índia dirigimo-nos a V. Ex.ª solicitando-lhe que se informe nas fontes competentes sôbre a veracidade dêsse fato para que à Sociedade Rural do Triângulo Mineiro como detentora do Registro Genealógico das Raças de Origem Indiana, tome as medidas que julgar acauteladora dos interêsses dos criadores brasileiros e bem assim os da pecuária nacional.

Cumpre-nos informar ao ilustre Deputado, que, em ofício do dia 6 de dezembro do Ministério da Agricultura, de nº 844 assinado pelo Diretor do Departamento de Produção Animal. Do Senhor Dr. João Ferreira Barreto, fomos solicitados para indicar um criador de zebú (sic) para integrar uma comissão composta de três elementos, sendo dois técnicos do Ministério da Agricultura, para percorrer as Índias e opinar sôbre a conveniência de se importar animais daquêle país para a melhoria dos nossos rebanhos zebuinos.

Seria realmente desagradável e uma perda de tempo e dinheiro irreconquistáveis para o nosso representante, Senhor Tôrres Homem Rodrigues da Cunha, criador conhecido em todo o Brasil, ir ao Oriente, tendo já de antemão um grupo ou grupos de importadores munidos de prévia licença.

Êste temor se acentua mais sabendo-se que o senhor Pedro Cruvinel Borges, aqui residente, já se encontra nas Índias para selecionar gado por conta da firma importadora EMIL, sediada no Rio de Janeiro.

O alarme entre os criadores do Triângulo Mineiro e de outras regiões interessadas no zebú (sic), nos aconselha a solicitar informações seguras sôbre o assunto, visto que é pensamento da Rural e da quase totalidade dos criadores, que se não houver gado que nos sirva, não se deve importar e, se houver que o Registro Genealógico a cargo desta Sociedade tenha uma função conjunta com o Ministério da Agricultura, no sentido de um policiamento da qualidade a importar, pois, assim, essa importação beneficiará exclusivamente àquêles que necessitam, evitando dessa forma uma evidente margem de exploração comercial.

Aguardando o resultado dêsse nosso pedido, agradecemos-lhe antecipadamente e renovamos a V. Ex.ª a segurança de nossa elevada estima e grande admiração.

Respeitosamente — Sociedade Rural do Triângulo Mineiro. — Carlos Smith. Presidente.

O Sr. Galeno Paranhos — Pelo que ouvi da leitura do ofício, parece que há um emissário na Índia selecionando gado, a fim de exportá-lo para o Brasil. É verdade?

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Exatamente. Há, realmente, pessoas na Índia com essa finalidade.

O Sr. Galeno Paranhos — Poderia V. Ex.ª dizer quem é êsse emissário?

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Chegando ontem ao Rio, encontrei, no "O Jornal", uma notícia com o seguinte título — "Gado indiano importado por privilegiados". Nesta notícia encontrará V. Ex.ª os nomes dessas pessoas:

"GADO INDIANO IMPORTADO POR PRIVILEGIADOS

- Licença apenas a três grupos — Possível especulação com os pequenos criadores — Dificuldades do Departamento Nacional da Produção Animal.

Um golpe de conseqüências funestas para os criadores nacionais está na iminência de ser consumado se o Ministério da Agricultura não evitar a especulação a ser concretizada com a importação de gado indiano para três grupos que obtiveram imprescindível licença.

Há tempos o Presidente da República, atendendo à necessidade de proporcionar o refrescamento de sangue dos rebanhos nacionais de gado zebu leiteiro, assinou decreto autorizando o Ministério da Agricultura a conceder licenças para importação, na Índia, de gado leiteiro. Baseado nesse decreto, três grupos obtiveram daquele Ministério licença para importação de 673 rezes Oyr, Nelore e Guzerat. O grupo mais forte, do Sr. Mário de Almeida Franco, criador em Uberaba, no Estado de Minas, obteve licença para 400 cabeças. A firma Emil, com atividade completamente alheia à pecuária, de vez que se dedica à construção imobiliária e importação industrial, conseguiu autorização para 203 cabeças. Esta já enviou seus representantes para a Índia, a fim de escolher o gado a ser adquirido. Finalmente, o terceiro grupo — o mais fraco, aliás — constituído dos Srs. Bruno da Silveira, industrial e seu sócio Veríssimo da Costa Júnior, criador em Barretos, conseguiu licença para apenas 70.

Fechada a porta

Daí por diante, pràticamente, foram fechadas as portas aos demais criadores. Todos quantos têm necessidade de importar um reprodutor apenas, para o seu rebanho, depara com uma série enorme de dificuldades, antepostas principalmente pelo Departamento Nacional da Produção Animal, órgão ao qual estão afetas medidas imprescindíveis para a obtenção da aludida licença.

A solução

A aquisição das 673 rezes indianas por três grupos, com a exclusão do pequeno criador nacional, virá certamente provocar uma especulação, cujas conseqüências são imprevisíveis. Isto porque, precisando a maioria dos nossos criadores de reprodutores para os seus rebanhos, terão que sacrificar tudo que possuem para adquirir uma única cabeça. E os beneficiados serão sòmente os felizes importadores dos grupos acima mencionados.

A esta altura, o Ministro João Cleofas não poderá mais revogar as autorizações concedidas. Mas há um caminho que evitará possíveis especulações. E conceder a todos os criadores licença dessa espécie, ou, senão, fazendo como ó (sic) fêz com relação aos jipes e material agrícola: importando reprodutores diretamente da Índia e distribuindo-os, mediante o sistema de revenda, por preço de custo, aos criadores devidamente registrados naquele Ministério."

O Sr. Galeno Paranhos — Li essa notícia nos jornais de ontem. Hoje, porém, o Sr. Ministro da Agricultura nega haver autorizado quem quer que seja a importar gado da Índia. Devo lembrar a V. Ex.ª que, como o seu Estado, o de Goiás, na criação de gado zebu, uma das fontes maisí (sic) importantes para a sua economia. Por isso é que o gado de origem européia, o Alentejano, o chamado "pé duro", foi justamente melhorado com a raça zebuina e apresenta agora, aques (sic) três características que V. Ex.ª bem conhece: rusticidade, precocidade e rendimento.

Essas notícias causaram espécie aos criadores goianos. Recebi mesmo um apêlo da Federação das Associações Rurais de Goiás, no sentido de solicitar ao Sr. Ministro da Agricultura a inclusão, na comissão que vai estudar a conveniência, ou não, da importação de gado indiano, de um representante daquela entidade. Devo dizer à V. Ex.ª que não somos contrários à concessão, a criadores brasileiros, do direito de importar gado indiano, uma vez que essa importação se faça cientificamente, depois de estudadas tôdas as condições do gado a ser importado ...

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Exatamente.

O Sr. Galeno Paranhos — ... mas, o Sr. Ministro da Agricultura é que deveria importar êsse gado, para fornecê-lo aos criadores de todo o país, a fim de que pudessem êles melhorar seus plantéis.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Parece ser êsse também o pensamento da grande maioria dos criadores sócios da Sociedade Rural do Triângulo Mineiro e do Sr. Ministro da Agricultura, com quem estive ontem, logo que tomei conhecimento da notícia publicada no "O Jornal". Tenho, em mãos a nota a que V. Ex.ª se refere publicada no "O Jornal" de hoje, em que o Sr. Ministro da Agricultura declarou não haver licença alguma para importação dêsses reprodutores.

Como percebo a curiosidade dos Senhores Deputados pelo assunto que ora exponho, peço a Casa permissão para ler a nota do senhor Ministro da Agricultura:

NENHUMA AUTORIZAÇÃO ATÉ AGORA PARA AQUISIÇÃO DE GADO INDIANO

Uma comissão examinará antes o rebanho a ser importado — nota do Ministro da Agricultura

Do gabinete do ministro da Agricultura, recebemos a seguinte nota:

"Com referência à notícia publicada na edição de 23 do corrente do O Jornal, relativamente à importação de reprodutores zebú (sic) da Índia, o gabinete do ministro da Agricultura declara que são destituidas de fundamento as informações divulgadas, conforme os esclarecimentos, a seguir, do Departamento Nacional da Produção Animal do mesmo Ministério:

Preliminarmente, o diretor geral do D.N.P.A. manifestou-se contrário à concessão de licença para a importação de zebu sem prévio e detido exame da questão. Baseado nesse parecer, o ministro da Agricultura submeteu à consideração do senhor presidente da República, em outubro do ano passado, a designação de uma comissão, composta de um zootecnista e um sanitarista do Departamento e um criador indicado pela Sociedade Rural do Triângulo Mineiro, a fim de estudar, "in loco", as condições do zebú (sic) indiano. Aprovada essa sugestão deverá seguir em março proximo (sic) a comissão designada, e, só após a conclusão do estudo, o ministério estará em condições de autorizar ou não aquela importação. No caso afirmativo, ainda levará em conta o número de animais que fôr possível importar para decidir se deveria ser de exclusiva iniciativa do govêrno a importação ou se poderá beneficiar, diretamente, particulares interessados.

Se, como foi afirmado na notícia, "seguiram representantes para escolher animais" terão sido pessoas estranhas ao Ministério, por iniciativa puramente particular e sem audiência do D.N.P.A.

Nenhum criador ou firma comercial foi autorizado a importar zebú (sic) da India. Aos três interessados, que, segundo a nota daquele matutino, teriam obtido licença para êsse fim informou o Departamento, em ofícios de 13 e 15 de dezembro último, que o Ministério enviará àquele país a comissão aludida e, somente após manifestação favorável da mesma, estará habilitado a decidir.

Aléb (sic) dos três "grupos" referidos na notícia outros criadores, em número de oito, encaminharam iguais pedidos, compreendendo o total de 295 cabeças. Êsses pedidos, como quaisquer outros que venham a ser recebidos foram registrados para oportuno exame, e aos requerentes foram prestadas as informações acima citadas.

O ministro da Agricultura, dando divulgação aos presentes esclarecimentos, assinala o escruapulo e a correção com que tem agido no assunto o diretor do Departamento da Produção Animal."

Por essa nota verifica-se que o Senhor Ministro não deu autorização a que se refere a notícia do "O Jornal" de ontem. No meu encontro de ontem como (sic) o Sr. Ministro João Cleofas, S. Ex. declarou-me, categoricamente, que só autorizará a importação se a comissão nomeada para examinar "in loco" a excelência do atual rebanho zebú (sic) indiano opinar favoravelmente a essa importação. Mesmo assim, ela só se fará de acôrdo com os interêsses nacionais e a forma ou critério a ser adotado, relativamente a essa importação, será motivo de estudos, ainda.

Mas, o fato é o seguinte: já se encontram nas Índias três ou quatro compradores, adquirindo, antes do pronunciamento dessa comissão, antes mesmo da ida dessa comissão as Índias, gado para trazer para o Brasil sem que se saiba exatamente se isso representa, ou não, um prejuízo tremendo, não só para os criadores de gado do Triângulo Mineiro e do país, como para o próprio gado nacional, já que, segundo informam os técnicos do Ministério da Agricultura e os conhecedores do gado indiano selecionado no Brasil — e é hoje sabido por quase todos — o gado zebú (sic) brasileiro, de procedência das Índias, já é superior ao próprio gado indiano, em virtude de melhor pastagem, melhor alimentação, etc. e, sobretudo aprimoramento e cuidados zootécnicos especiais a que o submeteram os criadores do Triângulo Mineiro.

O Sr. Galeno Paranhos — Aliás, há na terra de V. Ex.ª, um registro genealógico perfeito dos melhores tipos depois de examinados.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Perdõe-me o ilustre Deputado, mas estou com o meu tempo esgotado e apenas desejo declarar à Casa que o fato é grave, sumamente grave, pois há convênio existente entre o Govêrno Federal e o Ministério da Agricultura regulamentado (sic) uma eventual importação de reprodutores bovinos. Os criadores estão alarmados e com tôda razão porque amanhã, violando êsse convênio e as instruções do Govêrno, teremos no Brasil gado de procedência indiada (sic) importado sem o menor escrúpulo, visando-se apenas ao lucro fácil. Longos e longos anos de sacrifícios, experiências custosas e tôda a sorte de dificuldade outras êsse o preço que tiveram de pagar os criadores triangulinos antes de poder atingir ao alto nível de excelência dos seus rebanhos. Nenhum criador é contrário à importação de animais puros, se êsses, realmente, foram úteis ao aprimoramento de nosso gado zebú (sic). Importou, porém, sem nenhum critério, importação essa feita por pessoas inescrupulosas, negocistas apenas que enxergam boa margem de lucro, sem atender aos reais e sagrados interêsses dos criadores brasileiros, é um crime que não é possível permitir se cometa. Os escandalososo (sic) de tudo isso, Senhores Deputados, é o fato de ser o pensamento do govêrno inteiramente desprezado. Os negociantes já se encontram nas Índias, sem que a Comissão do Ministério da Agricultura tenha para aquele país viajado... Não se sabe, ainda, qual o critério a ser adotado pelo Ministério da Agricultura caso venha a ser realmente interessante essa importação e o negócio parece que já está feito.

Fato grave, Senhores Deputados, que denuncio à Nação a pedido dos criadores de Uberaba e do Triângulo Mineiro e que integram a Sociedade Rural do Triângulo Mineiro.

Ainda asfixiados pela tremenda crise que quase arruinou a nossa pecuária, eis que outra ameaça paira sobre os criadores brasileiros — a importação inescrupulosa de reprodutores indianos sem que se apure a sua real conveniência.

A nota do Sr. Ministro da Agricultura, publicada nos jornais de hoje, é, porém animadora. Permita Deus que meia duzia (sic) de novos aventureiros do zebú (sic) não consigna (sic) aniquilar de vez os nossos criadores já tão sacrificados. Na certa o farão se conseguirem burlar a patriótica vigilância do Ministério da Agricultura.

Se for necessária, far-se-á a importação. Pelo govêrno pelas Sociedades Rurais interessadas, a fim de permitir a distribuição de reprodutores para todos os interessados. Nunca, porém, por pessoas ou grupos isolados, sem que se assegure benefício para o pequeno criador, também, que não dispõe de recursos para pagar preços escorchantes como os que serão, fatalmente, cobrados por esses exportadores. Devemos confiar, porém, nas palavras do Sr. Ministro da Agricultura e podem, também, nelas confiar os criadores brasileiros.

Era o que tinha a dizer. (Muito bem. Muito bem. Palmas).


DIÁRIO do Congresso Nacional. Sessão: 24/1/52. Publicação: 25/1/52. Assunto: Lendo oficio Sociedade Rural do Triangulo Mineiro denunciando grupo com o privilégio de importar gado indiano. p. 405. Coluna: 2.